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REFORMA E SIMPLIFICAÇÃO DOS LICENCIAMENTOS NO ÂMBITO DO URBANISMO, ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E INDÚSTRIA

04 Março 2024

Artigo por Liliana Milheiro

REFORMA E SIMPLIFICAÇÃO DOS LICENCIAMENTOS NO ÂMBITO DO URBANISMO, ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E INDÚSTRIA

A 4 de março de 2024 entra em vigor – de modo geral - o Decreto-Lei n.º 10/2024, de 8 de janeiro que, no quadro do Programa SIMPLEX, uma estratégia de modernização administrativa transversal ao Governo e aos serviços da administração pública central e local cujo principal objetivo é simplificar a atividade administrativa através da contínua eliminação de licenças, autorizações e atos administrativos desnecessários, numa lógica de «licenciamento zero», procede à reforma e simplificação dos licenciamentos no âmbito do urbanismo, ordenamento do território e indústria.

 

O que subjaz ao aludido diploma, para além da simplificação dos licenciamentos existentes, é a criação condições para que exista mais habitação disponível a custos acessíveis, pois a simplificação dos procedimentos vai contribuir para o aumento dos solos disponíveis e, consequentemente, vai levar a que os custos da criação de habitação sejam menores e os tempos de concretização de projetos imobiliários sejam mais reduzidos.

 

Neste sentido, são aprovadas medidas aplicáveis a toda a Administração Pública e a todos os procedimentos relacionados com o exercício da função administrativa, medidas de simplificação na área do urbanismo e ainda medidas de simplificação para o ordenamento do território.

 

No âmbito das novidades em matéria de urbanismo, destacam-se as seguintes:

 

1. Eliminação da necessidade de obter licenças urbanísticas, criando-se, para o efeito, novos casos de comunicação prévia, de isenção e de dispensa de controlo prévio

 

  • São criados novos casos de comunicação prévia com consequente dispensa de obtenção de uma licença urbanística

 

i) um plano de pormenor ou uma unidade de execução com certas características passam a dispensar a licença de loteamento, aplicando-se a comunicação prévia;

ii) um plano de pormenor ou uma unidade de execução que satisfaçam certas condições deixam de exigir a aprovação de obras de urbanização, sendo agora aplicável a comunicação prévia, quando até agora apenas a licença de loteamento permitia esta dispensa;

iii) uma unidade de execução com certas características também passa a dispensar a licença de construção, com aplicação do regime da comunicação prévia, quando até agora apenas o plano de pormenor e a licença de loteamento permitiam essa dispensa.

 

  • Novas situações de isenção, onde não existe qualquer procedimento administrativo de controlo prévio

 

i) quando exista aumento de número de pisos sem aumento da cércea ou fachada;

ii) quando estejam em causa obras interiores que afetem a estrutura de estabilidade, assegurando-se que o técnico habilitado declare, através de termo de responsabilidade que a estrutura de estabilidade é de considerar aceitável face à situação em que o imóvel se encontrava antes da obra realizada, podendo esse documento ter de ser exibido em eventuais ações de fiscalização;

iii) quando tenha sido obtida informação prévia suficientemente precisa;

iv) para a substituição de vãos por outros que, conferindo acabamento exterior idêntico ao original, promovam a eficiência energética.

 

  • Novos casos em que são dispensadas licenças urbanísticas ou outros atos de controlo prévio, apenas havendo lugar à emissão de um parecer mão vinculativo pelo município competente

 

É o que passa a suceder quanto a obras promovidas por empresas do setor empresarial do Estado, empresas municipais e intermunicipais relativas:

i) à instalação de equipamentos ou infraestruturas destinadas à instalação de serviços públicos;

ii) afetos ao uso direto e imediato do público;

iii) nas áreas portuárias ou do domínio público ferroviário ou aeroportuário; iv) quando sejam afetos à habitação ou para pessoas beneficiárias de políticas sociais, incluindo residências para estudantes deslocados;

v) a parques industriais, empresariais ou de logística, e similares, nomeadamente zonas empresariais responsáveis (ZER), zonas industriais e de logística; vi) para salvaguarda do património cultural;

vii) para gestão do parque habitacional do Estado, entre outros.

 

2. Simplificação dos procedimentos administrativos para obtenção de licenças urbanísticas, para a realização de comunicações prévias no quadro das informações prévias

 

  • Aprovação de um regime de deferimento tácito para as licenças de construção

 

Caso as decisões não tenham sido adotadas nos prazos devidos, o particular poderá realizar o projeto pretendido. O Decreto-Lei n.º 135/99, de 22 de abril, aprovou o mecanismo de certificação do deferimento tácito através da emissão de uma certidão obtida num procedimento eletrónico, o qual permitirá, a partir de 1 de janeiro de 2024, obter um documento que comprove o direito adquirido por deferimento tácito para a realização do projeto.

 

  • Eliminação do alvará de licença de construção

 

O alvará de licença de construção é substituído pelo recibo do pagamento das taxas devidas.

 

  • Adoção de regras relativas à contagem dos prazos

 

São adotadas várias regras para que a contagem dos prazos seja mais transparente. Assim, em resultado do disposto no citado diploma e da aplicação do Código do Procedimento Administrativo, com as alterações do Decreto-Lei n.º 11/2023, de 10 de fevereiro:

i) a contagem dos prazos passa a iniciar-se com a entrega do pedido pelo particular e não num momento intermédio no procedimento, sendo de difícil apreensão para o interessado;

ii) os prazos só se suspendem se o particular demorar mais de 10 dias a responder a pedidos de informação, documentos adicionais ou a outras solicitações da Administração Pública;

iii) apenas é possível pedir por uma única vez informações, documentos adicionais ou formular outras solicitações durante o procedimento.

 

  • Eliminação da necessidade de parecer da entidade competente em matéria de património cultural em algumas situações

 

Quanto a imóveis localizados em zonas de proteção de bens imóveis em vias de classificação ou de bens imóveis classificados de interesse nacional ou de interesse público, não há lugar a parecer da entidade competente em matéria de património cultural quando:

i) se trate de obras no interior de bens imóveis, desde que não se verifique impacte no subsolo, ou alterações relativas a azulejos, estuques, cantarias, marcenaria, talhas ou serralharia;

ii) se trate de obras de conservação no exterior;

iii) relativamente à instalação de reclamos publicitários, sinalética, toldos, esplanadas e mobiliário urbano.

 

  • Possibilidade de delegar competências nos dirigentes dos serviços

 

Com o mesmo propósito de criar condições para que os procedimentos de licença urbanística sejam mais ágeis, permite-se a delegação de competências nestas matérias nos dirigentes dos serviços, assim evitando a concentração de competências no vereador com pelouro.

 

  • Alargamento do prazo de validade da informação prévia favorável

 

O prazo de validade da informação prévia favorável é alargado de um para dois anos, sem necessidade de solicitar prorrogações.

  • Admissão da prorrogação do prazo de execução das obras

 

Permite-se que o prazo de execução das obras possa ser prorrogado sem os limites atuais, de apenas poder ocorrer uma única vez e por período não superior a metade do prazo inicial.

 

3. Adoção de medidas uniformizadoras dos procedimentos urbanísticos

 

Com o objetivo de uniformizar procedimentos urbanísticos e de evitar que existam práticas e procedimentos diferentes em vários municípios, são adotadas medidas para impedir tratamentos injustificados e assimétricos, quando essa assimetria não se justifica. Note-se que as presentes medidas não prejudicam a possibilidade de cada município ter as suas próprias normas acerca da ocupação dos solos e condições de edificação. Estas apenas visam impedir que, em matérias de natureza procedimental e formal, não existam regras diferentes em cada município, as quais significam custos excessivos e desproporcionados para os particulares pela diversidade e dispersão das soluções adotadas.

 

  • Limitação dos regulamentos municipais

 

Os regulamentos municipais só podem abranger certo tipo de matérias, não podendo, por exemplo, abordar matérias relativas aos procedimentos administrativos ou a documentos instrutórios, assim procurando tornar os procedimentos mais semelhantes nos vários municípios do País.

 

  • Limitação dos documentos instrutórios exigíveis pelos municípios

 

Impede-se que os municípios possam exigir documentos instrutórios adicionais face aos previstos na lei e em portaria especificamente destinada à identificação desses documentos. Assim, é adotada uma lista não exaustiva de documentos que não podem ser exigidos, nem pela referida portaria nem pelos regulamentos ou pela prática dos municípios. Tal lista inclui a proibição de solicitar, por exemplo, os seguintes documentos instrutórios: cópias de documentos na posse da câmara, a caderneta predial, o reenvio de certidão permanente ou do seu código por o seu prazo de validade ter expirado quando era válido no momento da apresentação do pedido, o livro de obras digitalizado, declarações de capacidade profissional dos técnicos responsáveis pelos projetos, emitida por qualquer entidade, incluindo ordens profissionais, entre outros

 

  • Criação da Plataforma Eletrónica dos Procedimentos Urbanísticos

 

Esta plataforma é de utilização obrigatória para os municípios a partir de 5 de janeiro de 2026 e não será possível adotar passos procedimentais ou documentos que nela não se encontrem previstos. No entanto, os municípios poderão utilizar os seus sistemas informáticos, em interoperabilidade com a Plataforma Eletrónica dos Procedimentos Urbanísticos e o sítio na Internet do município continuará a ser um canal de acesso específico à mesma Plataforma, sem prejuízo de existir um sítio específico na Internet para apresentação e gestão de pedidos urbanísticos em todo o País.

A referida plataforma vai permitir:

i) apresentar pedidos online;

ii) consultar o estado dos processos e prazos;

iii) receber notificações eletrónicas;

iv) obter certidões de isenção de procedimentos urbanísticos;

v) uniformizar procedimentos e documentos exigidos pelos municípios, evitando a multiplicação de práticas e procedimentos diferentes;

vi) futura submissão de pedidos em formato Building Information Modelling (BIM), com automatização da verificação do cumprimento dos planos aplicáveis.

 

4. Clarificação dos poderes de cognição dos municípios no exercício do controlo prévio urbanístico, em especial relativamente à emissão de licenças

 

De modo geral, cabe aos municípios verificar:

i) a inserção do edifício no território (controlo do cumprimento dos planos, medidas preventivas, área de desenvolvimento urbano prioritário e de construção prioritária, servidões administrativas, restrições de utilidade pública e o uso proposto;

ii) a estética exterior e a inserção do projeto na paisagem;

iii) a suficiência das infraestruturas.

 

Não compete aos municípios apreciar questões relativas ao interior dos edifícios ou matéria relativa às especialidades (águas, eletricidade, gás, etc.), uma vez que os mesmos são elaborados com base em declarações de cumprimento das normas legais aplicáveis por técnicos competentes. A limitação dos poderes dos municípios no momento do controlo prévio ou emissão de licença não prejudica os seus poderes de fiscalização, ao abrigo das competências que lhes cabem em matéria de tutela da legalidade urbanística. É clarificado que tais poderes se devem exercer no quadro da legalidade e que se destinam a verificar o cumprimento da lei e não a adotar medidas de tutela urbanística com base em juízos de oportunidade, conveniência ou opiniões de natureza técnica.

 

 

5. Eliminação de determinadas exigências em matéria de controlo prévio urbanístico

 

  • Revogação ou substituição de certas exigências do RGEU

 

São revogadas ou substituídas certas exigências do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU) que se consideram limitativas sem corresponder à proteção de um interesse público atual.

A título de exemplo:

i) elimina-se a obrigatoriedade da existência de bidés em casas de banho;

ii) permite-se que possa existir um duche em casas de banho, em vez de banheiras; e iii) viabiliza-se a utilização de soluções para cozinhas como kitchenettes ou cozinhas walk through.

 

  • Revogação do RGEU com efeitos a 1 de junho de 2026

 

Num outro plano, aprova-se a revogação do RGEU com efeitos a 1 de junho de 2026.

 

  • Eliminação da necessidade de obtenção de licença específica para ocupação do espaço público

 

Elimina-se a necessidade de obtenção de uma licença específica para ocupação do espaço público e que se revela frequentemente necessária para as obras quando é fundamental, por exemplo, utilizar caixas de entulho ou andaimes. O pedido de licença de construção passa, assim, a poder englobar a ocupação do espaço público e a licença de construção abrangerá, nesses casos, a possibilidade de ocupação desse espaço na medida do que seja necessário para realizar a obra, dispensando-se procedimentos e atos adicionais.

 

  • Eliminação de exigências relativas às caixas de correio

 

São eliminadas as exigências desproporcionadas e excessivas relativas às caixas de correio, bem como a obrigação de os municípios verificarem o cumprimento das mesmas.

 

  • Requisição da presença de forças e serviços de segurança nas obras

 

A requisição da presença de forças e serviços de segurança nas obras é facultativa, não podendo ser exigida ao promotor por entidades públicas.

 

6. Adoção de medidas de simplificação do processo de obtenção da autorização para utilização

 

É eliminada a autorização de utilização quando tenha existido obra sujeita a um controlo prévio, substituindo-se essa autorização pela mera entrega de documentos, sem possibilidade de indeferimento, mas, naturalmente, mantendo-se todos os poderes de fiscalização durante e após a obra. Por seu turno, quando exista alteração de uso sem obra sujeita a controlo prévio, deve ser apresentada uma comunicação prévia com um prazo de 20 dias para o município responder, considerando-se aceite o pedido de autorização de utilização, caso o município não responda.

 

7. Simplificação dos processos em matéria de especialidades

 

Os municípios não apreciam nem aprovam projetos de especialidades, os quais são remetidos para mera tomada de conhecimento e arquivo, acompanhadas de termos de responsabilidade emitidos pelos técnicos competentes em como os projetos foram realizados em conformidade com a lei.

8. Simplificação dos processos de receção das obras de urbanização

 

A título exemplificativo, determina-se a obrigação de os municípios aceitarem a cessão para a sua posição contratual da garantia dada pelo empreiteiro ao promotor para a realização das obras de urbanização, eliminando o custo com a emissão de novas garantias.

 

9. Simplificação das formalidades relacionadas com a compra e venda do imóvel

 

Simplificam-se as formalidades relacionadas com a compra e venda do imóvel, eliminando formalidades que não representam valor acrescentado. Com esse propósito, sendo eliminadas, no momento da celebração do contrato de compra e venda do imóvel, a exibição ou prova de existência da ficha técnica de habitação e da autorização de utilização ou de demonstração da sua inexigibilidade.

 

 

No âmbito das novidades em matéria de ordenamento do território, destacam-se as seguintes:

 

1. Simplificação do processo de reclassificação de solo rústico em solo urbano, com finalidade industrial, de armazenagem ou logística

 

Trata-se de uma iniciativa fundamental para viabilizar projetos de natureza industrial de envergadura significativa, existindo hoje uma carência de espaços que possam ser afetos a esta finalidade. De igual forma, é um procedimento que se revela indispensável para aumentar a disponibilidade de habitação a custos controlados.

Nos termos deste processo simplificado:

i) realiza-se apenas uma consulta pública, evitando-se diversas consultas públicas com objeto semelhante ou sobreposto;

ii) prevê-se uma conferência procedimental, para todas as entidades se pronunciarem simultaneamente;

iii) determina-se que o procedimento não para durante o período de consulta pública, antes continuando a ser desenvolvido;

iv) atribui-se competência à assembleia municipal para a respetiva aprovação.

Este procedimento não se aplica em áreas sensíveis ou em áreas da reserva ecológica nacional ou da reserva agrícola nacional.

 

2. Criação de condições para acelerar os procedimentos de aprovação de planos de urbanização e planos de pormenor

 

i) eliminação do acompanhamento da elaboração dos mesmos pelas comissões de coordenação e desenvolvimento regional;

ii) eliminação da fase de concertação.

 

3. Criação de condições para a simplificação do controlo urbanístico

 

  • Criação de novos casos de comunicação prévia

 

Criam-se condições para a simplificação do controlo urbanístico através da criação de novos casos de comunicação prévia que substituam licenças urbanísticas, através de uma densificação do conteúdo das unidades de execução sem, contudo, prejudicar a flexibilidade que este instrumento atualmente oferece.

Deste modo, clarifica-se que as unidades de execução podem:

i) conter desenho urbano;

ii) incluir a programação das obras de urbanização;

iii) envolver contrato de urbanização para o seu desenvolvimento.

 

Caso a unidade de execução inclua o desenho urbano e a programação de obras de urbanização, deixa de ser necessária a licença de construção ou de loteamento, podendo as operações urbanísticas fazer-se na base de comunicações prévias, tal como acima se referiu.

 

 

 

 

 

 

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